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Sede da COP30 e outras 12 capitais não têm plano de mudança climática

Belém, no Pará, sede da COP-30, não tem plano de mudança climática - Ricardo Stuckert -11.abr.25/Divulgação
Belém, no Pará, sede da COP-30, não tem plano de mudança climática Imagem: Ricardo Stuckert -11.abr.25/Divulgação
do UOL

Do UOL, em São Paulo

31/05/2025 05h30Atualizada em 31/05/2025 09h25

Metade das capitais brasileiras não tem plano municipal de mudanças climáticas. A conclusão é do estudo "Crise climática e desastres socioambientais", realizado pelo IJSN (Instituto Jones dos Santos Neves) e antecipado com exclusividade ao UOL.

O que aconteceu

Treze cidades não estão preparadas para enfrentar desastres naturais, aponta o estudo. "As capitais são municípios que deveriam dar exemplos a outros municípios", afirma Pablo Lira, diretor-geral do IJSN e coordenador do Núcleo Vitória, do Observatório das Metrópoles. "É um cenário preocupante que demonstra negligência com as causas climáticas. Capitais são cidades com maior receita, por isso deveriam estar mais bem preparadas".

Treze municípios e o Distrito Federal possuem planos de mudanças climáticas, revela a pesquisa. A cidade que apresentou mais recentemente um planejamento para enfrentar situações de catástrofes ambientais foi Porto Alegre. O plano foi feito após o município amargar uma cheia histórica em maio de 2024 —quando o nível do rio Guaíba atingiu 4,96 metros de altura e ultraou o recorde da maior cheia registrada até então, em 1941.

Belém (PA), Campo Grande (MS), Manaus (AM) e Vitória (ES) têm planos municipais de mudanças climáticas em fase de elaboração. Segundo Lira, a capital paraense é um caso emblemático, já que é a cidade onde será realizada a COP30 em novembro —conferência internacional sobre mudanças climáticas. "Acredito que o plano não será concluído antes do evento", afirma o diretor do instituto. Para ele, ainda que o plano seja finalizado antes da conferência, dificilmente haverá tempo hábil para ser colocado em prática ou ter qualquer tipo de impacto antes do evento.

Cidade sede da COP-30 "não priorizou" plano de mudanças climáticas. "Belém não cumpriu a lição de casa. Isso a uma mensagem negativa, de negligência e irresponsabilidade tanto em relação à população quanto com a própria cidade", afirma Lira. A cidade é marcada, segundo ele, por alagamentos e inundações —principalmente, em períodos de maré-cheia— afetando populações que vivem em áreas de maior vulnerabilidade. "O município também é afetado por ondas de calor extremo, que poderiam ser amenizadas caso existisse um plano de mudança climática."

A prefeitura de Palmas (TO) disse que está em processo de estudo a criação do plano de ação climática. "O estudo de vulnerabilidade está em desenvolvimento, em conjunto com o instituto de pesquisa WRI Brasil, e aguarda resultado de um processo seletivo para receber apoio na elaboração do Relatório de Emissões de Gases de Efeito Estufa, ainda neste ano, por meio do apoio da cooperação técnica com o Fórum das Cidades Amazônicas." Segundo a istração municipal, no ano que vem deve ocorrer a contratação do Plano de Ação Climática. O UOL questionou as demais capitais, mas não obteve retorno até a publicação da reportagem.

'Longo caminho pela frente'

Não se está pensando na mitigação de impactos regionais, avalia o diretor do instituto. Os planos municipais devem levar em consideração as especificidades climáticas de cada região. "No Norte, existem riscos causados pelos efeitos das queimadas e dos processos de expansão em áreas urbanas. Já no Centro-Oeste, questões ligadas às estiagens prolongadas. No Sul, temperaturas extremas recorrentes; no Sudeste, fortes chuvas; e, no Nordeste, períodos de estiagem prolongada com fortes ondas de calor", diz Lira, que é doutor em Geografia e mestre em Arquitetura e Urbanismo.

Fora do país, eventos ambientais históricos incentivaram a criação dos planos municipais de mudanças climáticas. Em 1910, a inundação histórica em Paris, na França, permanece na lembrança da população local. "Essa memória está bem viva na memória dos parisienses pelo planejamento, conscientização e pelas medidas que foram adotadas depois." A cidade ou a investir na gestão das cheias no rio Sena, na instalação de marcadores para controlar o fluxo e sinalizar o nível da água do rio e na construção de barragens.

No Brasil, das 13 cidades mais o Distrito Federal que possuem planejamentos, menos da metade implementou mecanismos de monitoramento. Segundo o estudo, muitos planos existem no papel, sem previsão orçamentária ou articulação intersetorial. Cidades da região Norte e Nordeste apresentam as maiores dificuldades, como falta de "capacidade técnica e institucional para elaboração e execução de políticas climáticas".

Capitais como São Paulo, Curitiba e Recife se destacam com políticas mais consolidadas, diz o estudo. Essas cidades possuem em seus planos diagnósticos de risco, participação social e integração com os planos diretores e de mobilidade. Segundo o diretor do estudo, o ideal seria que esses documentos se tornassem projetos de lei e assem por audiências públicas nas Câmaras de Vereadores das cidades. "Não adianta o município ter um planejamento sem que a população conheça", afirma.

Planos devem ser monitorados e fiscalizados. Lira ressalta que os planos não devem existir somente "nos gabinetes dos prefeitos". "Eles precisam ser monitorados por fiscais das prefeituras e das secretariais municipais do meio ambiente", afirma. De acordo com o estudo, para que as ações climáticas sejam efetivas, é necessário analisar bancos de dados para encontrar cenários críticos, elaborar propostas com prazos e metas e definir indicadores que permitam um monitoramento efetivo.

Ministério quer apoio a cidades prioritárias

Questionado, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima afirmou que lançou em fevereiro o programa AdaptaCidades. Segundo a pasta, o projeto tem como objetivo apoiar estados e municípios com recursos técnicos e financeiros para desenvolver estratégias e planos locais e regionais de adaptação do clima. Onze estados demonstraram interesse em aderir ao projeto, informou o ministério.

Cada estado poderá indicar dez municípios prioritários com alto índice de risco climático. A pasta informou que poderão fazer parte do programa consórcios intermunicipais e associações de municípios em caráter excepcional e por indicação dos estados. A aprovação das indicações será feita pelo ministério com base em critérios técnicos, que levam em consideração o risco climático e o número de pessoas em situação de vulnerabilidade social.

Projeto do governo federal quer enfrentar dois gargalos para a construção dos planos locais de mudança de clima, segundo o ministério. São eles: a falta de capacidade técnica para avançar na elaboração dos planos e a dificuldade de financiamento. De acordo com a pasta, a meta do governo federal é ajudar na elaboração de 260 planos em 2025.

A catástrofe climática vivida no Rio Grande do Sul em 2024 não pode ser tratada como um episódio isolado, mas como parte de uma nova realidade que exige planejamento, investimento, prevenção, mitigação e adaptação. A ausência de planos atualizados compromete a capacidade de resposta das cidades, especialmente nos territórios mais vulneráveis.
Pablo Lira, diretor-geral do IJSN

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