Ensaio inédito de Michel Foucault sobre 'hermafroditas' será publicado em setembro na França
Um ensaio inédito do filósofo Michel Foucault, intitulado Os Hermafroditas, que analisa o período em que a medicina moderna ou a impor a definição de um único sexo biológico para cada pessoa, será lançado em breve na França, anunciou nesta quarta-feira (4) a editora Gallimard. O livro foi preparado a partir de arquivos do autor guardados na Biblioteca Nacional da França, com lançamento previsto para 18 de setembro.
Um ensaio inédito do filósofo Michel Foucault, intitulado Os Hermafroditas, que analisa o período em que a medicina moderna ou a impor a definição de um único sexo biológico para cada pessoa, será lançado em breve na França, anunciou nesta quarta-feira (4) a editora Gallimard. O livro foi preparado a partir de arquivos do autor guardados na Biblioteca Nacional da França, com lançamento previsto para 18 de setembro.
Em 1978, dois anos após publicar A Vontade de Saber ? o primeiro volume da obra História da Sexualidade ?, Foucault planejava dedicar um volume inteiro ao estudo dos hermafroditas. No entanto, com a mudança do foco de sua pesquisa para a Antiguidade, acabou desistindo dessa parte do projeto, conforme informa a editora.
Ainda assim, foi encontrado um manuscrito inédito, nunca antes publicado, no qual o filósofo desenvolve sua análise sobre o tema.
A origem da imposição de um sexo biológico
Foucault parte de processos judiciais realizados entre os séculos 16 e 18 para mostrar como houve uma transição entre um sistema legal que reconhecia um "sexo de decisão" ? ou seja, a possibilidade de escolher o sexo conforme circunstâncias sociais ? para um novo sistema em que cada indivíduo deveria ter um único e "verdadeiro" sexo, determinado pela ciência médica.
Esse texto é também o único no qual Foucault estabelece a distinção fundamental, tanto histórica quanto teórica, entre sexo anatômico e sexualidade.
O ensaio terá uma introdução de Arianna Sforzini, professora de filosofia na Universidade Paris-Est Créteil, e uma pós-introdução de Éric Fassin, professor de sociologia e estudos de gênero da Universidade Paris 8 Vincennes-Saint-Denis.
Segundo os dois pesquisadores, o texto é extenso e profundo, e poderia ter sido a primeira parte de um volume da História da Sexualidade, tendo provavelmente sido escrito entre 1975 e 1978.
Foucault não queria publicação após a morte
Michel Foucault faleceu em 1984 e deixou a orientação de não publicar seus escritos após sua morte, mas essa determinação foi modificada por seus herdeiros a partir da década de 1990.
Nos últimos anos, diversas obras póstumas têm sido publicadas: em 2023, O Discurso Filosófico, ensaio de 1966 no qual Foucault define o conceito de disciplina; em 2024, Nietzsche, uma coletânea de cursos e conferências sobre o filósofo alemão; e em maio deste ano, Arqueologia das Ciências Humanas, baseado em um curso ministrado na Universidade de São Paulo em 1965 ? todas pela editora Éditions du Seuil.
Foucault e o Brasil
Michel Foucault teve uma relação importante e comprovada com o Brasil, principalmente marcada por sua visita ao país em 1965, quando ministrou um curso na Universidade de São Paulo (USP).
Conhecido como Arqueologia das Ciências Humanas, a disciplina foi fundamental para a difusão de suas ideias no meio acadêmico brasileiro e teve grande repercussão. Recentemente, esse material foi publicado postumamente, evidenciando a importância daquele momento para a presença de Foucault no país.
Desde então, as obras do filósofo francês começaram a ser traduzidas e amplamente divulgadas no Brasil, influenciando diversas áreas, especialmente filosofia, sociologia, ciências humanas e estudos de gênero. Suas análises sobre poder, disciplina, sexualidade e instituições ajudaram a moldar debates acadêmicos e políticos no país, especialmente no que diz respeito a direitos humanos, sistema penal e questões relacionadas à sexualidade e identidade.
Foucault é uma referência constante em universidades brasileiras, onde seus conceitos são discutidos em seminários, congressos e grupos de pesquisa. Suas ideias também inspiram ativistas e pesquisadores que trabalham nas áreas de gênero e sexualidade, contribuindo para a construção de políticas e discursos que defendem a diversidade e os direitos LGBTQIA+.
Além da influência intelectual, a visita de Foucault ao Brasil representa um marco na história do pensamento crítico no país, conectando o cenário brasileiro às principais correntes filosóficas e sociais internacionais da época.
(Com AFP)