Governo e partidos decidem hoje se cortam supersalários para resolver IOF
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e os líderes dos partidos políticos no Congresso Nacional prometem decidir ainda hoje as mudanças legislativas que precisam ser aprovadas para substituir o impopular aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), reajustado no mês ado por decreto para tentar compensar o rombo nas contas da União.
O grupo vai discutir pelo menos quatro alternativas: reduzir a isenção fiscal para alguns setores da economia; diminuir rees federais para financiar a educação básica; enxugar supersalários do funcionalismo público e antecipar o recolhimento de dividendos de estatais.
O que está em discussão?
Mercado financeiro pressiona o Congresso para derrubar o decreto. Para evitar uma derrota, Haddad apresentou alternativas aos presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-AP), e do Senado, David Alcolumbre (Republicanos-PB), para compensar os R$ 60 bilhões que o IOF poderia arrecadar até 2026. Na terça (3), os três saíram de um almoço com Lula dizendo que a divulgação do acordo ocorreria só depois de uma reunião neste domingo (8) com os líderes das bancadas partidárias.
Preciso da aprovação [no Congresso] de, pelo menos, uma parte das medidas [em discussão] para rever o decreto.
Fernando Haddad, ministro
Supersalários na mira. Haddad espera que os parlamentares ponham um limite nas verbas indenizatórias recebidas por alguns servidores, como juízes e promotores. Esses penduricalhos elevam seus proventos para além do teto constitucional, criando supersalários.
A proposta chegou a ser aprovada pelo Senado em 2016. Mas o texto só foi votado pela Câmara em 2021, e aguarda, desde então, que os senadores avaliem as mudanças feitas pelos deputados. Em dezembro do ano ado, Lula tentou limitar os penduricalhos com uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição), mas o Congresso alterou o texto após pressão do judiciário. Agora, as verbas ficam liberadas até que o projeto de lei seja finalmente avaliado pelo Senado.
Educação básica pode perder dinheiro. As negociações incluem a revisão dos investimentos no Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica), criado para reduzir as desigualdades regionais e garantir a universalização da educação básica. Principal fonte de financiamento dessa fase educacional, o fundo é abastecido com impostos estaduais e municipais, mas recebe um complemento federal, que só este ano é de R$ 56,5 bilhões.
A proposta é reduzir o percentual da União. A fatia federal equivalia a 10% dos rees de estados e municípios em 2020. Naquele ano, porém, o Congresso aprovou uma lei que aumenta essa proporção anualmente, atingindo 21% em 2025. A ideia é pedir ao Congresso que aprove uma regra para reduzir essa proporção ou, pelo menos, impedir novos aumentos, um acréscimo que pode chegar a R$ 6 bilhões em 2026.
Empresas podem perder incentivos fiscais. A Fazenda espera que os congressistas diminuam os cerca de R$ 800 bilhões estimados pelo ministério em isenções tributárias a alguns setores da economia. "Agora o governo fica se matando para a cortar R$ 30 bilhões do Orçamento? Esse dinheiro poderia ser retirado da desoneração, desses R$ 800 bilhões. As pessoas acham que é um direito adquirido", disse Lula na terça.
Congresso manteve desoneração para 17 desses setores econômicos. Iniciado em 2012, o benefício consiste em trocar a contribuição previdenciária por um percentual do faturamento: em vez de recolher 20% sobre a folha de salários, a empresa paga de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, gerando até o ano ado uma isenção fiscal estimada de R$ 9,4 bilhões por ano.
Mudança mais promissora é antecipação dos rees dos dividendos de estatais. A ideia, revelou a Folha de S.Paulo, foi levada à Câmara dos Deputados por setores da iniciativa privada. Juntos, Petrobras, BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e Banco do Brasil têm uma reserva de lucro de R$ 28,9 bilhões, que poderia ser reada à União.
A pressão maior é sobre o BNDES, banco 100% estatal. Se os R$ 16 bilhões de sua reserva de lucros forem reados à União, chegará ao fim uma reserva que foi acumulada ao longo dos anos justamente para dar estabilidade aos pagamentos de dividendos.
Outra medida em discussão não inclui o Congresso. No começo do mês, o ministro Alexandre Silveira (Minas e Energia) ofereceu a Lula receitas extras de até R$ 35 bilhões com petróleo para aliviar as contas em 2025 e 2026. A principal proposta é a receita de R$ 15 bilhões com a venda de óleo nas áreas de exploração de Atapu, Mero e Tupi. O governo também espera que a ANP (Agência Nacional de Petróleo) revise os preços de referência do petróleo para o cálculo dos royalties.
Medida será "estruturante"
Haddad prometeu que as mudanças não serão paliativas. Ele chegou a dizer que a rejeição ao aumento do IOF pelo Congresso "foi a melhor coisa que poderia ter acontecido", já que agora o incremento na arrecadação virá de uma "reforma estrutural" em vez de um imposto emergencial. Espera-se que o acordo envolva pelo menos uma PEC e um projeto de lei.
Não é uma coisa para resolver só 2025. É uma coisa com impacto duradouro ao longo do tempo.
Fernando Haddad, ministro
Alcolumbre reforçou a necessidade de reforma maior. "Não poderemos rever um decreto sem discutirmos uma agenda estruturante do país", disse ele após o almoço com Lula.
Reforma ampla é vitória de Motta. Na semana ada, o deputado cobrou publicamente do governo uma proposta "que seja duradoura, consistente e que evite as gambiarras tributárias só para aumentar a arrecadação, prejudicando o país".