Barulho após concessão do Anhangabaú tira sono de vizinhos: 'Tortura'
Vizinhos do Vale do Anhangabaú, no centro de São Paulo, denunciam que após concessão do espaço à iniciativa privada, a sequência de eventos com som alto durante a madrugada impede que os moradores consigam dormir.
O que aconteceu
Moradores da região central criaram um abaixo-assinado para pressionar o poder público. No texto, compartilhado nas redes sociais, o grupo cita que o barulho está causando profundo estresse e que o som alto tem feito as estruturas dos prédios tremerem. "Além da poluição sonora, essas festas projetam canhões de luz nas fachadas dos edifícios, causando ainda mais incômodo", diz comunicado.
As queixas também são de dificuldades de circulação de pedestres. Segundo os moradores, em dias de festas, a área é cercada com grades e tapumes, o que dificulta a locomoção de quem mora na região.
Apenas no mês de maio, ao menos quatro eventos foram realizados no local. Dede o início do mês ado, a fotógrafa Silvana Garzaro, 54, precisou criar estratégias para conseguir ter uma boa noite de sono. Algodões nos ouvidos, janelas fechadas e remédios para dormir. Nada disso funcionou.
"O que eu faço é descer com a minha cachorra e ficar na praça que tem ao lado do meu prédio, porque ela também fica super agitada com o barulho, não dá para ficar dentro do meu apartamento que é uma kitnet. Não consigo trabalhar, não consigo assistir TV, tenho sempre que sair para me acalmar"
Silvana Garzaro, moradora
Denúncias não surtem efeito, dizem moradores. Em maio, durante festivais de música eletrônica, vizinhos ligaram para a Polícia Militar ou para o 156, canal de denúncias da Prefeitura de São Paulo, mas segundo eles, nada foi feito. "Quando percebo que vai ter barulho, sinto angústia, ansiedade, tristeza e também dores musculares por conta da tensão. É uma sessão de tortura, e os eventos que fizeram em abril e maio foram os piores", acrescentou Silvana.
Ruídos acima do limite permitido
Em vídeos compartilhados nas redes sociais, é possível ouvir o barulho ao longo da madrugada. "Quando chega o final de semana, pensamos que vamos descansar, recarregar as nossas energias para mais uma semana de trabalho, porém o que ocorre é que somos surpreendidos por um barulho infernal a noite toda", diz uma moradora.
Aulas na Escola Municipal de Música de São Paulo, localizada na Praça das Artes, foram canceladas. Em agosto de 2024, os estudantes denunciaram que precisaram cancelar aulas e que o excesso de barulho faz tremer as janelas do edifício.
Abaixo-assinado pede que poder público crie normas que regulamentem os horários e limites de ruído para os eventos. Outra demanda é que a Prefeitura de São Paulo garanta a fiscalização das atividades promovidas no local, com o objetivo de garantir o direito ao descanso e ao bem-estar dos moradores dos arredores do Anhangabaú.
O Vale do Anhangabaú foi concedido à iniciativa privada em 2021, após reforma que custou R$ 105 milhões ao município. O contrato tem valor de R$ 55 milhões, incluindo despesas e investimentos. A contrapartida é a exploração comercial da área, como a realização de shows, por exemplo.
A concessão envolve um espaço público histórico, aberto ao público e que deverá manter essas características a partir da istração privada. A empresa assumiu gestão, manutenção, conservação, vigilância e limpeza por dez anos.
Mudanças na legislação de São Paulo. Em dezembro de 2024, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) sancionou o projeto de lei que tira o limite de barulho para shows e grandes eventos na cidade. A nova lei inclui eventos de grande porte e atividades de instituições de ensino entre as exceções que não podem ser penalizadas pelo PSIU (Programa Silêncio Urbano).
O Ministério Público de São Paulo informou que há um inquérito civil aberto investigar o barulho causado pelos eventos.
A Prefeitura de São Paulo também foi procurada para se posicionar sobre as denúncias dos moradores, mas não esclareceu se alguma medida foi tomada. Em nota, a gestão apenas informou que "a concessão do Vale do Anhangabaú tem se revertido em avanços para a cidade, proporcionados pela ampliação do o à cultura, da geração de emprego e renda e da democratização do espaço público".
A concessão determina que, para cada atividade de caráter particular realizada, o espaço deve receber dez atividades gratuitas. Somente no mês de junho estão previstas cerca de 440. A Secretaria Municipal das Subprefeituras prestou os esclarecimentos solicitados pelo Ministério Público em abril de 2025.
Prefeitura de São Paulo
A reportagem também tentou contato com a concessionária Viva o Vale, que istra o Anhangabaú, mas a empresa não respondeu. O espaço segue aberto para manifestação.